ONU cria polêmica ao defender o aborto em casos de fetos com microcefalia

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A mulher que desejar interromper uma gestação hoje no Brasil pode sentir-se “justificada” em sua decisão sob três circunstâncias: estupro, gravidez de risco ou, mais recentemente, se for detectada anencefalia fetal, que, em termos simples, deve-se a uma malformação do cérebro do bebê.  Qualquer motivo além desses constitui crime com penalidade prevista em legislação, o que a deixa com apenas duas alternativas: levar a gravidez adiante, ou submeter-se a uma intervenção clandestina que pode lhe custar até três anos de cadeia ou, em casos mais extremos, a própria vida.

Infelizmente, esses “casos extremos” não são raros. De acordo com a OMS, pelo menos 1 milhão de mulheres procurarão essas “clínicas” no período de um ano, resultando em mais de 180 mortes e 200 mil internações no SUS. O que esses dados sugerem a você? Qual é a nossa real necessidade? Uma fiscalização mais intensa? Ou uma revisão legislativa? De acordo com a ONU, a segunda opção não somente é a mais viável, como também a mais urgente. Até porque se esse cenário já era controverso, temos agora um novo elemento que põe ainda mais lenha nessa fogueira e reacende os debates: o atual surto de microcefalia em fetos, por conta do vírus Zika.

O princípio-base da lei atual é claro. O aborto somente é permitido em situações onde o bebê, obviamente, não terá a mínima chance de sobrevivência. Mas para a porta-voz da ONU Cecile Pouilly, somente isso não é o bastante. Segundo ela, a descriminalização do aborto é uma questão de direito humano e deveria ocorrer em cinco situações, e não apenas três, sendo elas “estupro, incesto, risco a saúde física e mental da mãe e em casos de bebês com deficiências consideradas graves”, o que inclui, obviamente, os casos de microcefalia severa detectados já no exame pré-natal. Note: não se trata apenas se o bebê nascerá com vida ou não. Para a ONU, importa também COMO será a vida deste bebê (e da mãe, por que não?) após o nascimento.

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Para o arcebispo dom Odilo Scherer, no entanto, isso nem sempre é algo previsível. “Toda gravidez envolve alguma incógnita (…) Um bebê microcéfalo (…) pode ter certa autonomia.” E de fato, o exemplo da jornalista Ana Carolina Cáceres está aí para comprovar esta hipótese. Ana tem microcefalia, e quando nasceu,  o prognóstico era que ela não sobreviveria. Hoje Ana tem 24 anos, e luta para que haja uma conscientização popular sobre o assunto. No entanto, enquanto dom Odilo vê o bebê microcéfalo como uma “missão” obrigatória as mães, inviabilizando a recomendação da ONU, a qual ele acredita ser uma nova forma de eugenia,  Ana vê esta questão como uma decisão individual, desde que existam políticas públicas de assistência aos pais destes bebês “Se ainda assim houver pais que decidirem abortar, a escolha  é deles. Só não dá para fazê-la sem o mais importante: informação”.

Infelizmente, é justamente esse item fundamental que ainda falta no posicionamento da maior parte de nosso povo. Atualmente, mesmo com uma legislação que, apesar de ultrapassada não é de todo inflexível, mais de 70% de nossa população é irredutivelmente contra o aborto sob qualquer alegação.

 Fontes: bbc1/ bbc2/ bbc3  Imagens: Reprodução/ midiamax/ semprequistione