Uso de terapias gênicas no tratamento do câncer pode acabar de vez com a quimioterapia nos próximos vinte anos

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Para Raccoon City, a cidade infectada de Resident Evil, não houve outra saída senão a explosão. Ou isso, ou todo o mundo seria comprometido pela misteriosa doença que a devastou. O fogo consumiu rua por rua, levando consigo todos os andarilhos, nem vivos nem mortos, que espalhavam a misteriosa praga por onde passavam. Raccoon e sua doença estavam destruídas para sempre. Solução perfeita? Poderia ser, se não fosse um “detalhe”: as pessoas sãs que possivelmente ainda estavam na cidade e foram destruídas com todo o resto. E infelizmente, é mais ou menos assim que ainda funciona a quimioterapia.

Pense que Raccoon é seu corpo. O câncer é a doença misteriosa. Os zumbis são as células cancerosas e os cidadãos limpos, as células saudáveis. Uma vez soltas na circulação, as drogas pesadas usadas no tratamento quimioterápico saem como atiradores às cegas, disparando em tudo o que veem pela frente. Vão-se células cancerosas, e saudáveis também. E o reflexo disto é claramente percebido na queda violenta no quadro do paciente. Além dos típicos enjoos, vômitos e queda de cabelo, podem se seguir outros efeitos colaterais ainda mais graves, como danos em vários órgãos e funções, assim como o desenvolvimento de outras doenças, inclusive um novo câncer.

E aí, você pode se perguntar: “Se os efeitos são esses, por que ainda se usa?”. Por um motivo simples, amigo. Cada estágio de câncer tem o seu tipo de tratamento, e nos casos onde a quimioterapia é cabível, ela é o melhor que a medicina tem a oferecer. Pelo menos, nesse momento. Porque, se tudo correr bem, “esse momento” passará logo. Tudo bem, não tão logo. Uns vinte anos, pelo menos. O importante é que, enquanto você está lendo esta matéria, uma equipe colossal de cientistas na Grã-Bretanha, com apoio governamental, não está poupando esforços nem dinheiro num esforço conjunto em ler outra coisa: nada menos que 100.000 amostras de DNA em busca dos genes do câncer.

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Todo esse acervo só foi possível graças às centenas de voluntários portadores de câncer e outras doenças que cederam “pedacinhos” de DNA tanto de células cancerosas quanto de células sadias. Agora, o trabalho dos cientistas é similar à um jogo de “sete” erros: comparar ambas as amostras e procurar as diferenças, pois é justamente nelas que esses supostos genes podem estar escondidos. Feito isso, será apenas questão de tempo para o desenvolvimento de terapias gênicas no tratamento destas doenças. Lembre-se: gene é origem, é começo. Logo, ao invés de uma penca de medicamentos para matar células cancerosas, bastaria uma pequena correção naquele gene que está “fora de lugar”. Trocando em miúdos, é como se ao invés de ficar tentando conter a inundação, alguém fosse lá e simplesmente fechasse a torneira.

E tem mais: a tendência é que isso revolucione definitivamente a medicina, tornando-se o modus operandi nos tratamentos não só de câncer, mas de outras doenças. Dia após dia, estamos colhendo os frutos dos mais de treze anos de batalha para decifrar o genoma humano, batalha esta que só terminou em 2003 (e pensar que hoje o mesmo trabalho é feito em apenas dois dias!). E valeu a pena. Hoje, pacientes de um tipo específico de câncer de mama causado por uma superatividade do gene Her2 já desfrutam de uma droga baseada em terapia gênica, o Herceptin. Mas, ainda não acabou. Temos um longo caminho pela frente, até o dia em que, nas palavras do prof. Jeremy Farrer, envolvido nas pesquisas, vamos olhar para trás, a quimioterapia e todos os seus efeitos serão coisas do passado e vamos pensar: ‘Deus, que tempos aqueles!

Fonte: telegraphinca   Imagens: Reprodução/tudosobrexanxere/ simplifiqueocancer