A polêmica que não quer calar: afinal, homossexualidade é uma questão biológica?

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“Bem, minha dúvida é simples, mas não “descomplexa”: o homossexualismo é, de fato, um comportamento biológico?” Diego Royal

Diego, na verdade sua questão é bem complexa, e acredito que os questionamentos que farei  incomodarão alguns. Bem, antes de começar a divagar, apenas uma pequena correção: o termo homossexualismo não é o mais adequado, pois o sufixo “-ISMO” remete-se a uma condição de anormalidade, doença, sendo mais correto dizer homossexualidade. Muitos estudos enxergam diferentemente essa questão. Alguns acreditam que a sexualidade é definida exclusivamente por fatores sociais, outros defendem que é uma determinação puramente biológica (já se nasce homo ou heterossexual), assim como há vertentes que dizem existir uma relação entre os dois fatores. E a sexualidade, Diego, é algo muito complexo: na natureza existem comportamentos sexuais variados, em que a homossexualidade é recorrente ou existe em algum período da vida de muitos animais. Encontramos também comportamentos diferentes dos que conhecemos, pois há grupos de animais em que é o macho que cuida da cria, e a fêmea é quem exerce o domínio da situação.

Nesse sentido, os valores do que é ser homem e do que é ser mulher são constructos sociais fortes: desde pequenos somos ensinados que homens devem brincar de carrinho, vestir roupas azuis, aprender a ser o “macho” da casa, enquanto a menina deve brincar de boneca, de casinha, vestir roupas cor-de-rosa, sendo preparada para ser mãe e dona de casa. E isso não influenciaria? Como disse a filósofa Simone de Beauvoir: “Não se nasce mulher, torna-se”, e o mesmo ocorreria para homens, pois há uma série de valores socialmente estabelecidos, em que não é permissiva a troca dos “papéis” impostos e existem uma série de regulações que tendem manter o que é colocado como “normal”. Além disso, seria possível negar possíveis influências das relações entre pais e filhos na constituição das características psicológicas? São questões a se pensar…

Mas também há o outro lado: nascemos com um aparelho reprodutor masculino ou feminino, e junto com ele vêm uma série de fatores genéticos, hormonais e anatômicos diferenciados. Várias pesquisas tentaram apontar alguns fatores que influenciam na sexualidade, apontando para irmãos gêmeos univitelinos que são homossexuais mesmo que criados separadamente, além de buscar diferenças na morfologia do cérebro ou apontarem fatores genéticos (como diferenças cromossômicas ou epigenéticos) como influências importantes na orientação sexual (Ver link). Porém, apesar de herdarmos toda uma estrutura biológica dos pais, sabemos que ela não é definitiva: cada ser humano é único, e ao longo de nossa vida o “aparato” biológico herdado se alterará, de forma que nosso sistema nervoso mudará completamente da “maquinaria” original. Em outras palavras, nossas emoções e sentimentos estarão atreladas as nossas histórias de vida, pois mesmo que dois irmãos sejam criados da mesma forma, jamais serão iguais.

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Além disso, a sexualidade não necessariamente é fechada: pode-se expressar variavelmente, ser diferente do que concebemos genericamente como homossexual x heterossexual. Por exemplo, uma pessoa pode ser predominantemente heterossexual e ter interesse, em algum momento da vida, pelo mesmo sexo, e vice-versa. Já na década de 1940, o biólogo Alfred Kinsey desenvolveu, a partir de estudos sobre o comportamento sexual, uma escala que leva seu nome, demonstrando que a sexualidade não é fixa e que pode variar ao longo de toda a vida. Nesse sentido, o desejo é algo muito mais complexo do que essa divisão binária estabelecida.

Por fim, cito que as atividades e comportamentos consideradas “masculinos” ou “femininos” variam de acordo com a sociedade e a época. Quem nunca ouviu dizer que na Grécia antiga era comum a iniciação sexual entre homens? Porém, antropólogos apontam que outras sociedades, como tribos africanas e indígenas (inclusive do Brasil), praticam atos homossexuais ou mesmo têm uma outra visão acerca do homossexual, sendo que algumas consideram o homossexual como uma mulher. Portanto, as percepções que temos sobre a sexualidade é uma construção de nossa sociedade, e claro que o órgão sexual traz consigo uma série de características biológicas, mas não determina nossos desejos e identidade.

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Fonte: drauziovarella/ wikipedia/ unisinos/ ensaiosdegenero  Imagens: veja/alagoasweb/exame
Artigo: ARÁN, M.; PEIXOTO JÚNIOR, C. A. Subversões do desejo: sobre gênero e subjetividade em Judith Butler.